sexta-feira, 6 de janeiro de 2017

O pacto

O trato era o seguinte: deixar que as mulheres escolhessem. Simples assim. 

Nenhum dos quatro poderia paquerar determinada menina na balada. Os amigos tinham que eleger uma turma de garotas (sempre quatro ou mais), chegar junto, bater papo e esperar. Tinha que partir delas a escolha do seu par. E ninguém podia dar pra trás. A ideia veio do Juninho, o mais sem graça da turma – meio óbvio – mas foi bem aceita pelos demais: Pimenta, Cris e Nando. Aos que questionavam o pacto, alertando pro risco de um deles pegar uma tremenda baranga, Juninho sacava o lema: “Quem come de tudo, tá sempre mastigando”. Fazia sentido.

Naquela noite, a festa prometia. O flyer vendia bem o peixe, destacando em letras coloridas: “Balada das Academias – as melhores academias da Zona Sul numa noite pra lá de quente”. A moçada caprichou na vestimenta, nos acessórios e até na água de colônia, em doses mais que generosas. 

Chegaram na danceteria e logo se posicionaram num canto próximo ao bar, outra de suas artimanhas. Ou era ali, ou perto do banheiro das garotas, facilitando o approach. Juninho foi logo lembrando: “um por todos e todos por um, sem sacanear, trapacear, nada, falei?”. “Pô, Juninho, tamo no esquema, fica tranqüilo, rapá!”, disse Nando. 

Radares ligados, era hora da escolha do time adversário, dificultada pela mania de garotas andarem aos pares – isso definitivamente atrapalhava os planos. Mas então o Pimenta deu o alerta: “Quatro, ali, perto do DJ”. 

O jogo começara. Não que a equipe escolhida fosse só de craques... tinha uma loira bem apanhada, uma negra mignon, uma morena grande e do tipo gostosona e tinha, claro, a patinho-feio da turma. Sempre tinha. Era o risco que se corria. Mas, “quem come de tudo...”.

Os meninos deram o bote, oferecendo cerveja e se apresentando. Sorrisos pra lá e pra cá davam uma certa esperança. Mas a coisa não andava. Segundo o pacto dos garotos, não se podia monopolizar a conversa num primeiro momento. O papo tinha que ser coletivo, todos falando em doses iguais, até que as garotas começassem a seleção. Geralmente acontece assim: quando tem interessa, a menina aproveita a “deixa” do seu eleito e estende aquele assunto, colocando sua mão sobre o braço do cara, se posicionando ao seu lado. Sempre ficava muito claro. Então os demais entendiam que aquela já tinha “dono” e esperavam pela sua vez. Isso acontecia, digamos, até os 10 minutos do 1º. tempo. Quinze, no máximo.

Mas, naquela noite, o papo parecia não ter fim. Ninguém fazia o primeiro movimento e as coisas estavam saindo do controle. A ponto do próprio Juninho propor irem ao banheiro. “Vocês sempre vão ao banheiro juntos? Achei que fosse coisa de mulher...”, riu Denise, a cobiçada morena-das-coxas-grossas. “É a cerveja fazendo efeito sincronizado”, explicou o CDF da turma, Cris, ajeitando os óculos em tom professoral. E lá se foram, intrigados. 

Na ausência dos rapazes, as meninas, mais que depressa, armaram uma mini-reunião emergencial ali mesmo, ao lado da caixa de som. “Genteeee! Que babacas. Os caras não fazem nada...”, gritou a loira. “Assim fica difícil, Dê. Como a gente vai saber quem é a preferida de quem?”, perguntou aflita a baixinha. “Vai ver eles tão confusos, por isso o banheiro coletivo”, argumentou a desprovida de beleza. Denise armou-se da pose de líder ao dizer: “Isso nunca aconteceu, é verdade... mas não vamos mudar nosso pacto por causa de um bando de frouxos! Vamos é mudar de alvo”. Aprumando o radar, ela levantou a cabeça e “varreu” a balada com os olhos. “Ali. Cinco. Perto do camarote. ´Bora”, ordenou. 

Bete, a feia (olha o clichê), se pôs à frente das garotas e lembrou, solene: “Maaaas... trato é trato. Nada de trapacear, jogar charme pra um só, essas coisas. Chances iguais. Uma por todas...” 

- “E todas por uma!”, gritaram em coro as amigas. 

E lá se foram: predadoras no papel de caça indefesa. Sempre dava certo e naquela noite não devia ser diferente.

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