segunda-feira, 26 de dezembro de 2016

Os meios e o fim

Eles se beijaram algumas vezes, sempre final de noite, sempre desinibidos pelo álcool. Sexo? Em todas essas vezes. Nunca houve nenhuma promessa de que tal farra se transformaria em relacionamento. Quiçá amor. 

Ela sabia disso, sabia de tudo, aliás. Não se podia chamá-la de estúpida. Era, definitivamente, uma mulher esperta. E, nesta esperteza, tinha uma meta muito clara: fisgar aquele homem. A estratégia permanecia turva, mas uma vez definido o objetivo – pensava - o “como” era um mero detalhe. 

Revestiu-se de falsa humildade. Agüentou humilhações impensadas. Dividiu o objeto do seu afeto com outras mulheres. Sempre calada. E cada vez mais determinada. Na verdade, essa tremenda provação dava gana. Assim, lá estava ela, sempre pronta para os escassos beijos com gosto de chopp na alta madrugada. 

Aos poucos, a tática foi mostrando algum resultado. Sua presença discreta, que nada cobrava, passou a ser mais requisitada, especialmente numa fase em que o dia-a-dia dele era um caos completo. A mulher que ele realmente gostava mudou de país. O trabalho demandava horas-extras demais. Mal tinha tempo de ver os amigos e badalar. Nestes momentos confusos, ela era um aconchego, um rosto familiar (quase isso). Uma pessoa que estava sempre ali. Oferecendo carinho, silêncio e sexo. 

Uma viagem, alguns eventos juntos, mãos dadas certo dia num shopping. Pequenos gestos transformaram nada em alguma coisa. E o tempo trouxe o polimento que faltava para tornar aquilo em uma relação estável. Monogâmica. Tradicional. 

De forma a não restar dúvidas sobre sua obstinada vitória, ela engravidou.
Avisou-o pelo whatsapp a caminho do apartamento deles. 

Enquanto ela comemorava com um sorriso nos lábios e em habitual silêncio, ele pensava em uma forma de dar fim àquela miserável existência. Se perguntando como e quando tudo tinha ficado tão sem sentido. E, afinal, porque a vida era bege.

Nenhum comentário:

Postar um comentário